sábado, 26 de janeiro de 2013

Despe-te

Despe-te de tuas vestes.
Disponha-se a se cobrir de céu.
A comunicar a transparência, ser limpa, sem mácula.

Despe-te de ti mesmo.
Rasgue suas façanhas, borre seu batom.
Se olhe no espelho, se veja do outro lado.

Encara-te a ti mesmo.
Seja infiel com a verdade.
Ao menos se confronte.

Despe-te das máscaras que te ocultam.
Encara-te a ti mesmo.
Seja límpido como o riacho que corta a floresta.

Despe-te da normalidade.
Seja insana, enxergue a loucura por entre os lábios.
Professe uma fé contraria.

Ao menos despido de ti, estarei despido de mim.
E poderei renascer por entre a fuligem do velho pássaro.

Despido, sem mácula, sem máscaras e claro como o riacho.


quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Dias

Têm dias que não dá para ter voz!
Têm dias que as vozes se calam.
Que os olhos se fecham inseguros.
Que a garganta segura o nó do não engolido.
Têm dias que tudo é nada e o nada é tudo.
Há dias em que tudo seca,
Não existem mais estoques de lágrimas.
Tudo foi derramado, esbanjado e desperdiçado.
As palavras doces agora estão salgadas e amargas.
O gosto do desgosto é degustado no prato do sedento.
Do sedento de paz, de vida de liberdade.
Têm dias que a fé se torna grão e não move montanha nenhuma!
Eu até grito com as montanhas para que se movam, mas nada acontece.
Os deuses fecham os oráculos.
Só resta eu comigo mesmo.
Eu que sou fraco, fragmentado e minúsculo.
Levanto os olhos em direção ao horizonte.
O céu se abre em uma cortina negra com pontilhados brilhantes cor de prata.
A lua brilha mais forte e dentro de mim a voz calada grita.
Sinto a brisa trazer as respostas, tudo muda de repente e a certeza de dias melhores invade-me a alma.
E o fim se torna o início do inicio de um fim.





sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Amor, vazio poético.

Eu e minha busca desesperada por um amor...
Será que este amor que tanto procure existe?
Se dá em pé de alguma árvore ou brota do chão como os lírios do campo?
 Tem cheiro? Cor?
Ando vagando pelas ruas como alma desencarnada a espera do ceifeiro que tarda em não me encontrar. Será o ceifeiro o meu amor, ou o beijo frio e mortal da morte?
Meu peito lateja a dor da falta, nada supre o vazio e a fraqueza na qual ele se encontra.
Engraçado que o amor é comum para tantos, mas para mim é raridade. Não é nada comum, não consigo encontrar nas esquinas, nos bares ou nas músicas. Os poetas ainda me enganam, me inspiram e me deixam apenas no estado alquímico de acreditar que tudo não passa de uma perfeita combinação.
Ah, sabe de uma coisa, se este amor, e falo do amor dos poetas, fosse bom de verdade eles não acabariam em catástrofes e nem lamentariam a perda dos seus ou se desse tempo, a perda de sua própria vida. Este amor me amedronta e me deprime. Mas pelo menos uma coisa temos muito em comum,olhamos para a lua e fazemos do céu nosso altar, depositamos ali nossas preces e cantigas e acreditamos ser correspondidos pelo universo, os raios da grande lua abençoam meus lábios e me devolvem ao coração a mais linda forma de amar, se isto é o amor eu não sei por certo, porém, sei que choro, e minhas lágrimas nestas horas não são de dor, e sim da alma de um ser que encontrou ali a porção faltante do seu coração vazio.


quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A parte

A parte que parte ao meio
Que deixa em pedaços quadriculados ou sem forma alguma.
A parte que sangra, inflama e que ama.
A parte do amor que completa o amado.
Todas elas pensei ter em mente, estar consciente.
Mas não!
O inteiro somente é inteiro quando nossas partes se encontram, se encaixam.
Como peças de um quebra cabeça.
Num encontro de inteirices. 
Ouso até ser redundante porque o amor é redundante, repetido e as vezes sem graça.
Mas ao mesmo tempo, em parte, é único.
Cheio de si e cheio do outro.
Partes que eram distintas, diferentes, e que agora se igualam, viram uma e se tornam inteiras.


segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Ter e Ser

Ter e não ter.
Ser e não ser!
A roda gira de pressa.
O moinho que gera a força.
A força que completa o homem.
O homem que tem vontade de ser,
E que deixa de ser para ter.
Ter é sempre mais importante.
A ganância da abundância.
A vontade acima da razão.
A razão que perde para o desejo.
O desejo que cega o sujeito.
O sujeito que no fim apenas é.
Volta a ser e não mais tem.
Não tem ninguém.
Apenas a si próprio.


domingo, 6 de janeiro de 2013

O dono da dança

A dança da vida mais uma vez começa.
A música que preenche o espaço e marca os passos?
São tantas!
O velho que varre as folhas secas do chão;
A porta emperrada da padaria que se abre;
A sirene de uma viatura que passa;
O silêncio de uma mulher que me olha com olhos falantes;
O sino da igreja que toca;
O andar, os gestos das tantas pessoas que madrugam no ponto de ônibus;
As luzes que se apagam ao cair o véu claro da manhã;
O pombo que cisca contente a árida terra;
O pardal que bica a migalha de pão;
O cachorro que brinca com seu dono;
O dono que não escuta.
O dono que não fala.
Que emudece as perguntas.
Mas o único que dança, porque sentiu tudo. Porque viu que a vida canta e sua melodia é tão simples quanto a sua forma simples de viver, tão simples como a brandura de sua alma.