terça-feira, 30 de outubro de 2012

Des-visita-me

Tenho um pedido, um último que seja. Rebobine o rolo de fita, queime as imagens em que apareço. Não revele minha estranha ausência daquilo que nem mesmo sei se conhecia. Que conhecimento que nada! Não deu tempo. Para estas coisas o relógio para, ou corre acelerado, o tempo não perdoa. O tempo que alguns chamam de Deus, para mim se parece mais com o demônio. Assim digo, pois, me atrasa o sentimento, me faz perder o sentido, a noção, a delicadeza e o coração. Já não tenho fôlego, a dúvida me afoga com suas enormes ondas de desconfiança. Me sufoca e me tortura. Não quero mais visitações, se for para visitar, desejo que fique, e que fique à longo prazo. (Des)visita-me se não for permanecer! Não se aproxime, prefiro sofrer as dores do silêncio sozinho, do que ter o desprazer de uma visita que me arranca a alma em segundos e me condena a dor gritante de uma eternidade.



segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Pétala



Do que me adianta correr livre pelos campos esverdeados, sentir o macio toque da terra fresca que se espalha por entre meus dedos, cantar junto com os passarinhos, sentir a brisa acariciando de leve meus cabelos e arrancar um sorriso da minha pálida face? 
Me diz, do que adianta alcançar notas e contar as estrelas como passatempo, esperando que o sono venha e me alivie o coração?
Fadado estou eu, a passar desacordado as noites, porque você na sua inocência talvez, conseguiu enganar minha lucidez, e roubou meus pensamentos. E agora sou eu, prisioneiro seu. Prisioneiro do sentimento que em mim de tão grande não cabe, descabe em mim a capacidade de entendimento, e já nem sei se quero entender, só quero viver.
Ora, pelos campos encontro variadas flores e ervas, mas desta, a que tenho em mãos me resta apenas uma pétala, e não quero desperdiçá-la.





sábado, 27 de outubro de 2012

Sereia


Escuto o som, som de uma voz deslumbrante, que fascina, que apaixona. Me faz estremecer o coração, sinto calafrios, mas não são de medo, é quase uma mistura de emoção com intrepidez. Me embriaga, me cambaleia. Que voz é essa? Voz de sereia! Pensei, senti, tremi. Corri contra o vento, meu veleiro balançava e ameaçava me jogar aos braços da voz cantante. Tudo parecia estar a favor dessa minha insanidade, o vento, o veleiro, as ondas e a voz. Algo me dizia que seria meu fim, ou talvez, meu começo. O começo de uma vida desvivida. A voz incansável, se limitava a repetir o refrão de uma música que eu sabia já ter escutado em algum momento de minha vida: ''Eu não sabia buscar, foi quando apareceu o que eu quis inventar, para preencher o meu mundo particular no peito que era seu, no seu mundo não há mais nada que não eu já sei dizer que o amor pode acordar.'' E com esta melodia, com letra que já conhecia, fui cedendo aos encantos da voz que dizia, ou melhor, que cantava. O vento agitava as ondas, e rasgava as finas velas do velho veleiro.O veleiro já não suportava as imensas e vorazes ondas, e também já não precisava suportar. As ondas o engoliram facilmente, como se fosse a mais saborosa refeição. E eu? Hah, eu me encontrei na voz e com a voz. E o cantar incansável se tornou cansado, eu também. E como todo som, toda voz e toda música, uma hora para de tocar, assim parou meu coração. Então dormi,quando acordei percebi que o amor é uma vida, e que agora eu desvivia. 






quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Avalon

Tem dias que eu desejo profundamente que Avalon fosse real. Que em momentos atribulados, eu pudesse atravessar o lago de separação dos mundos, afastar as brumas que a rodeiam, e simplesmente ficar por lá, contemplando a magia fluindo dos quatro polos, enquanto aspiro o cheiro doce do incenso e das ervas frescas colhidas no herbarium. Ver a dança das nuvens enquanto acompanho o entardecer, ansioso para que a grande lua ilumine e toque com apenas um feixe a minha testa me dando a benção sagrada. Este mundo talvez não exista em sua forma física, mas sei que em em meu coração ele existe. E é pra lá que eu vou!



Verdade?!


O que é a verdade?
Ainda existe?
Creio eu, que ela vive escondida por entre os cantos e os encantos.
Nutre-se das melosas palavras, as vezes até sinceras,porém, com duplicidade de sujeito.
A verdade meia dita,ou seria mal(dita).
Intencionada e aflorada.
Sentidos desfigurados.
Verdadeiro é o lobo,
que se exibe  na maciez e inocência da pele de um cordeiro.





Casinha de Pico.


 Tudo o que eu queria agora, era você, casinha de pico, onde ninguém pudesse roubar da minha boca as minhas canções, as minhas palavras, me roubar de mim, da minha sensatez! 
 Queria o silêncio, gritando mansinho e fazendo brotar de dentro de mim a paz, e a magia do sagrado. 
 Assim como os brotos da caixeta, que crescem mesmo depois de dilacerarem seu viçoso corpo, provando de que tudo é possível, mesmo depois de profundos cortes, a vida sempre continua.






O Bote

É hora!
É chegado o tempo, o minuto, o segundo. 
É bem vindo o bote que me leva a desbravar o mundo.
Mundo que não é meu e nem seu, é de todos, é da mãe.
É do verde, do amarelo, do cheiro e da diversidade.
Quero o verde e o amarelo, quero o cheiro, mas não o da cidade.
O cheiro da relva, do carvalho, do pinheiro e da lavanda.
Cheiro sem voz, mas que fala tudo!
Cheiro que encanta.




A Pérola






 Certa vez me perguntaram o que eu faria em situações de desgosto, insensatez, inconvenientes, enfim, situações desgastantes que infelizmente (ou felizmente) acabamos nos sujeitando ou sendo sujeitados, nesta nossa vida de amores e desamores. Minha resposta então, veio carregada com uma antiga história que minha avó em sua sabedoria me contou.
 A história da formação da pérola. 
 Ela dizia que a ostra por ser pequena e achatada, acabou se alojando onde os outros seres marítimos achavam ser desinteressante ou a pior das moradias; o solo, a areia. Então, querendo provar para os outros seres de que ela estaria no mais valioso dos terrenos, começou por acaso a literalmente degustar dos pequenos grãos de areia. Tudo o que ia ficando no interior de suas largas e sensíveis aberturas, aos poucos ia se formando, se agrupando, recebendo forma e brilho, até que um dia do seu interior, se conseguiu expelir uma das mais valiosas preciosidades do mar. A pérola. Com base nisso, pensei, o que poderia fazer com toda a sujeira que diariamente ingerimos, e cheguei a conclusão de que podemos transformá-las em pérolas, sendo estas a construção do nosso próprio {eu}, da nossa identidade, e por fim do nosso caráter.