quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

A voz do vento

 Têm dias que levantamos tão sensitivos, que conseguimos quase tornar palpável as energias que fluem ao nosso redor. 
 Hoje resolvi fazer diferente dos cristãos, enquanto entoam cânticos e rezam alto na esperança socorrida de serem ouvidos. Me silenciei, para ouvir a voz do mistério. Senti a água que me purificava no banho e agradeci a ela por tamanha dádiva. Me senti tão vivo e desperto, como se estivesse dormindo a dias, anos ou talvez por décadas. O espírito cega, quando a escolha é somente a matéria. Me vesti, e pensei ter ficado ali aquela sensibilidade, até que o vento que soprava mansinho, veio brincando por entre as copas das árvores e trepadeiras e sussurrou em meus ouvidos um doce som de paz. Tive a impressão de ter escutado literalmente uma calma e terna voz. Senti as árvores confirmando toda essa experiência mística, quando duvidava. Tive certeza que os dedos do sagrado me moviam. Em particular meu íntimo se continha fragmentado pelas demasiadas pedras no caminho, mas percebi a intenção do sagrado em mover estas pedras, fazendo-me ao menos sentir um alívio, como bálsamo posto por entre as feridas para amenizar a dor e me fazer ouvir.
 O sopro é a voz do vento, do vento que é sopro, e que se torna suave ou veraz quando precisa. E o  mistério é o sagrado, o sagrado habita em mim, e logo somos o próprio mistério.

Ruan Sena


segunda-feira, 10 de novembro de 2014

E se tudo fosse eterno?

Comecei meu dia admirando as paisagens que me rodeavam, como sempre os arranhas céus conseguiam inibir as mensagens cósmicas que o universo pintava em cada sistema da cadeia natural. O que homem tem feito? Absolutamente nada!
Tomei fôlego e acessei a minha caixa de memórias, consegui arrancar de mim tantos sentimentos bons, que logo me transportaram para um mundo totalmente livre de toda modificação humana. Algo interessante foi acontecendo com meus pensamentos, enquanto a brisa fresca de uma manhã pós chuva soprava de leve meu rosto. Senti como se essa brisa transpassasse por entre toda matéria; era como se respirasse a mim e não o oposto como fazemos cotidianamente. Me trouxeram pensamentos de paz e harmonia, e me fez lembrar de como a vida é linda, de como acordar todas as manhãs é mágico assim como o dormir para sonhar. Me perguntei que valor daríamos aos sentimentos, as realidades, as pessoas, a construção do homem em todas as suas facetas, a  natureza, o universo... Que valor seria atribuído a toda dimensão que nos cerca, se tudo fosse eterno? Se tudo o que vivemos, sentimos, todas expressões que pude imaginar, ainda assim me perguntava, como seria se tudo fosse eterno? Pergunta que ainda persiste e persistirá cravada em mim por demasiados dias. A resposta não consigo nem imaginar, é tão subjetiva quanto o homem. Responde-la pode danificar minha visão de mundo na qual quero preservar. Até porque todos sabemos que nada é tão valioso quanto as eventualidades e singularidades da vida.

Ruan Sena


segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Borboletas

  Pedra mole é o coração; bombeando sentimentos e os distribuindo em correntes por todo o nosso organismo.As borboletas no estômago, os arrepios constantes, a vontade de se despir, os desejos a flor da pele, sensações que se misturam a racionalidade das coisas. 
  Ainda me lembro de quando eu e o cupido tivemos nosso último diálogo até encontrar você. Dizia para me abrir, e deixar fitar meu coração rígido e petrificado. Foram poucas suas palavras até me convencer de que a procura se torna sem sentindo quando não se sabe o que se procura. A procura pode trazer e trouxe muitas escolhas precipitadas, resultando em desgaste e emparedando mais ainda meu coração. Quando entendi o sentindo da "espera", ela me trouxe você, assim como imaginava. O diálogo rico em experiências, o aroma do café passado na hora, o cheiro do incenso impregnando a divisão da sala, o som agradável vindo do notebook revisado várias vezes apoiado sobre a base de madeira improvisada. E o tempo se perdia, correndo solto e livre feito passarinho enquanto prendiamos nossos pensamentos numa melodia de Chico Buarque, a canção tocava nossa alma, a letra falava da gente e a gente se tornava "um", numa perfeita combinação de tamanha estranheza aos que espiavam curiosas pela janela. 
  Pensando sobre tudo, soltei algumas risadas de leve, quando lembrei e cai em mim o quanto fazia sentido um dos ditados que minha bisavó adorava repetir: " Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura".



quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Sobre as palavras

  Me preocupo com o fluido que minhas palavras produzem. Se são positivas e causam leveza aos que lêem ou as escutam, ou se soam ásperas e desconfortáveis. Esta pequena intenção modifica intensamente os nossos dias, nossa pessoa e por consequência desta mudança interior também modifica principalmente os nossos relacionamentos em si. Acredito então que a harmonia e bem estar estão dentro de cada um de nós e sua exteriorização demanda de nossas próprias decisões e escolhas e que precisam ser cotidianas. 
  Já diziam por aí "a boca fala do que o coração esta abundante...", pensamento que me acompanha sempre e me instiga a um questionamento pessoal, me conduzindo a uma profunda reflexão sobre os meus constantes diálogos. Se tenho edificado ou destruído, amado ou odiado, alegrado ou aborrecido... 
  Como seria interessante se todos começassem  a valorizar o uso das suas palavras, tirando o foco das ofensas e das grosserias e maximizando os poderes energéticos da gentileza e da humildade. Sem dúvida, estaríamos respondendo aos anseios dos grandes pensadores deste século e dos séculos passados, e muito além de espiritualidade e religiosidade, estaríamos respondendo ao nosso próprio chamado como ser humano, deixando de ser um andarilho por esta terra para ser a própria terra.

Ruan Sena





sábado, 2 de agosto de 2014

Espelhos

 Certo dia cai dentro de mim, num abismo sem fim. A cada segundo pensava eu ter encontrado o fundo do fundo, mas não! Era apenas minha consciência tentando desacelerar meu coração tão aflito e ritmado. Não encontrava meus jardins, minhas tantas palavras e princípios, tudo e todos se perderam na mera busca de chão.
 Daria tudo naqueles poucos segundos, pra sentir o que sentia antes, apenas sentir, pois nem isso conseguia mais...
 Meus sentidos não mais obedeciam meus comandos, que coisa não! Logo eu que pensava estar tudo sobre controle. Tudo me feria, até mesmo o suspiro que lentamente eu me esforçava em liberar.
 Então, não vi luz, nem fundo de túnel algum como muitos costumam te encorajar por aí; apenas avistei de longe um espelho, e neste espelho o reflexo de mim, dos créditos e marcas, das verdades que não sentia medo de assumir caso fosse preciso. Me construí assim, não tem dessa de verdade absoluta. No fundo do fundo, do túnel, no fim das forças, só existia "Eu" e eu já era o bastante.



quarta-feira, 30 de julho de 2014

Homens e pássaros

Um homem quando livre, voa mais alto que os pássaros.
Os pássaros ainda se prendem aos seus instintos, enquanto os homens se lançam na beleza dos pensamentos. Pensamentos estes, que geram emoções diversas; e quão gostoso é senti-los expressos no brilho de um olhar.
Um homem livre não teme a solidão, porque encontra nela reforço companhia para os misteriosos  caminhos da vida. A capacidade única de se interar com o meio no qual estamos inseridos, proporcionando mudança e sendo a mudança em si, é contida e liberada no segredo da liberdade. Quem a descobre não se permite mais prender pelas correntes da ignorância, e assume sua essência humana com uma satisfação inexplicável.
Homens não têm asas como as dos pássaros, mas gozam de asas imaginárias que levam muito mais além do que os limites do imenso céu que nos circunda; e estas por mais que o corpo pereça,se guarda viva e vibrante, até que repouse novamente sobre a matéria.






Véspera de Imbolc

Equinócio de Primavera.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Árvore Seca

  Hoje meus pensamentos amanheceram dublados e frios como um dia cinzento de inverno. Me sinto como árvore seca que perdera suas folhas e cores mas continua viva, esperando o primeiro raio de sol da primavera, para assim então sentir o vigor de suas folhas exalando cor e vitalidade mais uma vez. Ah que vontade de sentir novamente aquele calor que impregna a alma e o coração. Que me energiza e arranca sorrisos espontâneos sem precisar dizer nenhuma palavra. O clímax do momento sobressai toda irrealidade criada por minha tao obstruída visão de mundo. 
  A magia da vida se renova a cada ciclo, uma ordem natural que não conseguimos escapar, nos resta sobreviver, adaptar, criar de forma sábia alguns escapes. Ser realista as vezes é muito interessante, mas em tempos de crise, qualquer cantinho mágico alivia o cansaço do caminho pedregoso.


Outono/2014

Ruan Sena


terça-feira, 20 de maio de 2014

Recipocidade

   Quando falamos de reciprocidade, é necessário que primeiro analisemos nossas próprias condições e exigências a respeito do que se é de fato recíproco; talvez, me falte uma definição exata do que significa a tal manifestação sentimental e qual o seu lugar ocupado em nossas vidas.
Mesmo sendo várias as formas de se explicar,de forma geral, ser reciproco é ser presente numa relação entre duas partes, quando existindo de um lado, existe de igual modo no outro. Assim, um sinônimo de reciproco é ''mútuo''.
   Concordo com a definição, ser recíproco é ser mútuo. 
   A questão é quando tal definição me é exagerada de certo modo que eu a faço mesclando sentimentalmente os meus próprios desígnios e vontades. Precisa-se ser empata no sentido mais simplista  de se colocar no lugar do outro, levando em conta toda sua carga emocional, sua personalidade, suas relações com o espaço na qual está inserido e etc. Defender idéias próprias sobre a forma com a qual ''EU'' particularmente quero e desejo ser tratado tanto prejudica sua conduta frente as relações quanto a relação em si. 
   Estamos vivendo num mundo de carência afetiva exageradamente grande, alguns perderam a vontade de dar sem esperar nada em troca, respeitando o tempo de cada um. Nós queremos e exigimos esta recompensa afetiva. Ora se dei flores é porque já estou pensando no caminhão de rosas que quero á minha porta. Bom, acho que as flores ficam mais bonitas no jardim, onde o perfume é mais doce e as borboletas vem pousar, alegrando mais o ambiente. 
   Não é falta de romantismo, muito pelo contrário, o romance é mais interessante quando simples e ocorrido no momento inesperado e carregado de espontaneidade. 
   Enfim, de todas as palavras, penso e logo escrevo que antes de recíprocos na forma egocêntrica de ser, precisamos ser empatas. Analise o que acontece de verdade ao seu redor,esteja atento aos detalhes pequeninos que se escondem nas grandes exigências, perceba e sinta as palavras, os gestos, não se apegue as suas próprias vontades, elas são bem vindas, mas em determinados momentos nos cegam e nos privam de ver o belo á nossa frente.

Outono/2014

Ruan Sena


terça-feira, 22 de abril de 2014

Aprendi com os pássaros.

   Quando todas as vozes se calarem, os sentimentos esfriarem, as palavras não mais forem suficientes, assim serei eu novamente. Voltarei a ser parte de mim e de mais ninguém. 
   Ora, quando me despir das minhas próprias verdades e fluir em todas as demais que me circundam, encontrarei assim a minha própria mais uma vez, escondida nas entrelinhas dos pensamentos mais ricos e também dos menos valorizados. 
   De que me serve tanta gentileza e zelo com minhas palavras que nem sempre são bem entendidas? Quase nunca são respondidas ou correspondidas. O fato é que não sei ser alguém de qualquer jeito, não sei fazer as coisas por fazer e nem pensar somente por pensar. Sou mais que isso! Sou como os pássaros que migram no inverno para uma terra de verão, busco sempre estar quente porque de tanta frieza no mundo, os corações tem se tornado cada vez mais congelados até chegarem a um estado de petrificação sentimental irreversível. Migre você também, mude sempre que for preciso, escape por entre a multidão e contagie outros com esta positividade. É preciso, acredite!
   Por um mundo de sensibilidades é que escrevo e nunca cessarei de escrever. Espero que surta algum efeito, aos poucos que me visitam e se assumem se encontrar nestas palavras, assim, juntos vamos sendo a diferença no meio dos diferentes.


Outono 2014

Ruan Sena

terça-feira, 25 de março de 2014

Retrospecto

   Ando trocando passos com a solidão, tropeçando em pedras pontiagudas que perfuram meus pés cansados do caminho árido e longo que tenho percorrido. Minhas pernas bambas procuram um encosto junto á sombra de uma árvore de copa bem grande. Ali, descansando começo a observar o quanto tenho andado distraído e deixado me escapar por entre os dedos os grandes pequenos detalhes da vida. Detalhes que fazem tanta diferença, quando além de serem percebidos, revelam nosso verdadeiro eu e se tornam parte de um conjunto de idéias que constroem o nosso próprio ser.
  Tem gente que não valoriza o passado, dizendo ser ele algo medonho e até mesmo vergonhoso em determinados casos; preferem camuflar esta realidade e abandonar as velhas idéias, afinal é sempre mais fácil jogar fora o que está estragado do que concertar. Fico pensando em aspectos quantitativos se tratando de corações que assim como o meu resolveram ser diferentes e se permitiram a se aventurar por paixões, gestos e carinhos e que acabaram sozinhas neste mesmo lugar que me encontro, algumas nem pararam para descansar e outras encontraram seus abismos. Percebe-se uma certa descartabilidade neste sentido.
  Encaro o passado como um ritual de iniciação, onde o objeto ritual sou eu mesmo. Todos os paramentos são necessários para que o êxtase e o sucesso de um encantamento atinja o resultado final esperado. Toda palavra é válida e essencial, todos presentes colaboram para que seja edificada a mistica da vida. As melodias, ah como gosto delas, fico fascinado com sua capacidade de nos remeter a momentos que passamos e que como marca ficam cravadas em nossa memória.
  Levanto os olhos ao céu então, e caio em mim que já é noite, o céu escuro pontilhado de prata e a grande lua ostentada como uma coroa brilhava pra mim, fiquei ali observando por alguns segundos a beleza disso tudo, e encontrei novamente as forças e a coragem que havia perdido pela estrada, pude avistar um novo caminho, incerto talvez, mas era o meu caminho, peguei toda minha bagagem, amarrei ao coração e me aventurei mais uma vez, até porque de sentimento para sentimento o que vale sempre é a grande intenção de amar.



Ruan Sena

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Dedico este texto aos meus amigos Lucas Assis, Eliomar Castro, Kall de Sá , Felipe e João Paulo Cunha que me ajudaram a elaborá-lo partindo das experiências partilhadas com minha pessoa, meu muito obrigado e carinhos a vocês.